Na passada segunda-feira foi anunciado que Vivianne Miedema vencia pela primeira vez o prémio de futebolista do ano para a BBC. Este prémio realça ainda mais o fantástico ano de 2021 que a avançada holandesa está a ter, com os seus golos e assistências a catapultarem o Arsenal na Europa e também na liga inglesa, onde continua a bater recordes. Até mesmo nos Jogos Olímpicos não foi só a melhor marcadora da competição como ainda bateu o recorde de golos no torneio, ao apontar 10 em seu nome. Na Women’s Super League tornou-se a melhor marcadora da história da competição ainda na temporada passada, ultrapassando a sua actual companheira de equipa Nikita Parris, quando fez o hat-trick às Spurs. E no passado fim-de-semana, quando marcou o primeiro golo do jogo com o Manchester United, conseguiu mais um recorde: tornou-se a primeira jogadora da liga a marcar contra todas as equipas que já defrontou. Fantástico!
É difícil descrever a qualidade de Miedema. Para alguém que tem apenas 25 anos de idade, tem já um curriculum invejável e ainda tem tanto para conquistar. Aos 14 anos de idade era já profissional. Aos 21 chegou ao Arsenal. Nesse mesmo ano venceu o campeonato da Europa pelo seu país, onde contou com golos à Inglaterra nas meias finais e fez um bis na final contra a Dinamarca. Em 2018, marcou o golo da vitória na final da Continental Cup e que deu o primeiro troféu a Joe Montemurro enquanto treinador do Arsenal. Também no mesmo ano marcou na final da FA Cup, mas infelizmente não foi suficiente para levar de vencida a equipa do Chelsea. Em 2019, o Arsenal voltou a ser campeão inglês e Miedema foi a melhor marcadora da competição, algo que voltou a repetir no ano seguinte. Mas Miedema tem mais do que qualidade e capacidade de fazer golos. Se alguma vez houve um jogo em que pudemos ver o estilo de Miedema foi na famosa vitória por 11-0 frente ao Bristol City. Para além de fazer um hat-trick em cada parte, ainda assistiu para quatro golos antes de acabar por ser substituída. Foi um jogo em que toda a gente ficou de boca aberta.
Ainda assim, apesar de todos os elogios de que é alvo, de todos os troféus que conquista e de todos os recordes que continua a somar, continua a ser um jogadora bastante humilde e que não gosta de dar nas vistas. Ela não gosta que os holofotes estejam apontados para si, que procure o reconhecimento de toda a sua qualidade pela comunidade do mundo do futebol. Os troféus individuais são apenas uma consequência da sua caminhada enquanto jogadora. Ela joga para a equipa, querendo que a equipa vença acima de si própria, algo que é representado na sua posição em campo. Apesar de jogar no típico número 9, Miedema de facto prefere descer no campo, receber a bola e ajudar na construção de jogo. Isto pode ser de facto algo alarmante para os adeptos “normais” que veem a sua avançada a abandonar a posição para ir receber a bola e ajudar no ataque. Mas Miedema não é a típica número 9.
Na realidade Miedema é uma jogadora que combina dois jogadores em si. Tanto é uma finalizadora nata como consegue criar oportunidades de golo de uma típica número 10. Este papel “híbrido” que desempenha deu ao Arsenal uma maior flexibilidade no ataque, que poucos clubes podem usufruir. Na temporada passada foi comum ver Miedema a trocar posições com Caitlin Foord ou Beth Mead, com uma das companheiras a deslocar-se para o centro enquanto a holandesa descaía para a linha. Esta rotação de movimentos deu frutos, por exemplo no empate a uma bola contra o Chelsea na temporada passada, quando Viv correu pela ala para cruzar para a área e apareceu Mead a finalizar e a fazer o golo das Gunners. Por isso, ela tornou-se uma peça crucial neste Arsenal e é a figura de proa para o nosso regresso aos troféus. E isso é um grande problema.
Ter uma avançada de qualidade mundial como é Miedema traz inúmeros benefícios ao clube. Golos dão vitórias e com Miedema na equipa, os golos são quase garantidos. Por isso faz todo o sentido usar a holandesa sempre que possível de forma a garantir golos e vitórias, em particular numa liga em que uma derrota pode ser o passo em falso que pode terminar com as esperanças de um título. Mas esta dependência excessiva de um jogador ao longo da temporada, semelhante a Thierry Henry em 2005/06 e Robin Van Persie em 2011/12, pode levar a que não exista oportunidade de haver rotação. O Arsenal tem tido bastante sorte pois desde a temporada 2018/19 que Miedema não tem sofrido lesões ao contrário de outras estrelas do clube, como Kim Little ou Jordan Nobbs. Mas jogar todos os jogos da temporada passada levou claramente a avançada ao limite, e no final da época, quando o Arsenal garantiu o regresso à Liga dos Campeões no empate sem golos frente ao Aston Villa, Miedema estava completamente de rastos.
O segundo problema de não se fazer rotação à estrela da equipa deve-se ao facto de não ter ninguém do mesmo nível. Não havia ninguém de nível semelhante para ter no banco, para poder entrar nos últimos 10 ou 15 minutos do jogo, ou ser titular em jogos de menor dificuldade como nas primeiras rondas da Continental Cup ou da FA Cup. Com Danielle Carter a sair do clube, o Arsenal deixou de ter uma reserva para Miedema. Por isso, esta temporada Jonas Eidevall optou por usar Caitlin Foord como “segunda” opção, permitindo que Miedema pudesse prolongar as suas férias e a australiana deu conta do recado nos primeiros jogos da época. Esta foi a escolha lógica (juntamente com Beth Mead) para dar a oportunidade de Miedema descansar. Ainda assim, com Foord em campo a qualidade não é a mesma e é notório o “drop” que acontece na equipa quando Viv não está. Esta é uma visão terrível do que se poderá tornar esta equipa do Arsenal no mundo pós-Miedema. Uma visão do inferno que se poderá tornar real já na próxima temporada.
No próximo verão o contrato de Miedema chega ao fim – juntamente com os de outras estrelas do clube – e até agora, apesar do início promissor da era Jonas Eidevall, não há qualquer noticia que a avançada vá continuar no norte de Londres. Perder Miedema, e perder uma jogadora destas sem qualquer retorno financeiro, pode ser um desastre. No entanto existem alguns sinais de esperança. Primeiro de tudo ela gosta muito de estar no Arsenal. O seu jogador favorito enquanto crescia na sua carreira de futebolista era Robin Van Persie e chegaram a se encontrar no Feyenoord, a equipa de infância de Miedema. Para além disso, e ao contrário de outras colegas de equipa, Miedema comprou casa no norte de Londres juntamente com a companheira Lisa Evans, ao contrário de apenas alugar como normalmente fazem as jogadoras do Arsenal Women. Ela adora viver em Londres e não deseja sair para outro clube da Women’s Super League. No entanto, para além de jogar na Liga dos Campeões, ela pretende vencer também a competição, algo que o Arsenal ainda está longe de conseguir. No verão passado, Danielle van de Donk decidiu sair do Arsenal para Lyon de forma a conseguir isso e não será surpreendente que Miedema procure dar o mesmo rumo à carreira no final desta temporada. Como já foi dito anteriormente Miedema tem 25 anos, e estará em breve no auge da sua carreira. Com certeza não quererá deixar de poder lutar pelos principais títulos.
No entanto, por muitas dúvidas que possam existir para o futuro, vivemos um período de celebração em honra de uma das melhores jogadores do clube desde a saída da fenomenal Kelly Smith. Chegará o dia em que Miedema irá decidir sair do Arsenal, algo que irá mexer com o coração de todos os adeptos. Mas até lá, vamos apreciar todos os momentos mágicos que a holandesa proporciona dentro de campo e que nos permite lutar por troféus. Com a final da FA Cup da temporada passada a disputar já no próximo domingo, dia 5, e com a liga a correr bastante bem, vamos esperar que este prémio de jogadora do ano não tenha sido o último que conquistou enquanto jogadora do Arsenal, mas sim o primeiro de muitos.
Ricardo Pires