Vamos mais ou menos a meio da janela de transferências para a nova temporada e o Arsenal foi já associado a um número infinito de jogadores para diversas posições – algo que já não é uma surpresa para quem acompanha o clube ano após ano.
O facto de se mencionar a palavra ‘Arsenal’ associada a qualquer jogador gera logo um número incrível de cliques na internet e vários órgãos de imprensa fazem de tudo para tentar saciar a nossa sede pelos rumores em todos os mercados de transferência.
Dito isto, uma curiosidade interessante acerca dos jogadores a quem o nosso clube é associado este ano é que todos eles são jogadores com menos de 25 anos de idade, e quase todos eles atuam na Premier League.
Os rumores acerca de Ben White, Rúben Neves, Yves Bissouma e James Maddison são reais. E quando digo que são rumores reais refiro-me a serem noticiados por diversas fontes fidedignas, que tanto estão próximas dos responsáveis do clube como dos intermediários dos negócios, o que significa que há verdade nessas noticias que vão saindo.
Curiosamente, o Arsenal não tem tido grande interesse de contratar jogadores provenientes da Premier League nos últimos anos. A última vez que pagámos por um jogador com menos de 28 anos na liga foi por Danny Welbeck, no longínquo Deadline Day de 2014. Alguém tinha noção disto?
Os jogadores que o Arsenal contratou na Premier League nos últimos 6 anos foram Petr Cech, Henrikh Mkhitaryan, David Luíz, Cédric Soares e Willian – um é guarda-redes, outro chegou num negócio de troca de jogadores, outro para ocupar a vaga deixada à pressa por Laurent Koscielny e os dois últimos estavam sem contrato.
Contratar jogadores fora de Inglaterra é positivo. Há sempre muitas e boas opções a atuar em outras ligas e que podem chegar sem se pagar aquele imposto que parece existir nos jogadores da Premier League e que os torna mais caro que os outros. Se tudo correr bem, os clubes acabam por poupar uma boa parte das receitas para transferências quando comparado a contratar jogadores semelhantes a atuar no principal escalão do futebol inglês.
Vou tentar colocar aqui um exemplo – vamos olhar para Kieran Tierney. Foi um jogador que o Arsenal foi buscar ao Celtic por uma verba a rondar as 25 milhões de libras. Este é um exemplo de um excelente negócio para primeira opção na lateral-esquerda. Contratar um jogador semelhante ao nosso lateral escocês na Premier League e conhecendo a realidade dos números do mercado atual, o negócio nunca ficaria por menos de 50 milhões de libras, como prova a transferência de Ben Chilwell do Leicester City para o Chelsea em Agosto de 2020. Foi um bom negócio fora de portas por parte dos responsáveis do Arsenal.
Por outro lado, no entanto, existem certos inconvenientes a ter em mente. Um jogador que chegue de uma liga estrangeira tem sempre de passar pelo período de adaptação – Arsène Wenger dizia que nunca eram menos de seis meses – especialmente quando este é jovem. Não são muitos os que chegam e causam impacto imediato – especialmente quando estes são contratados por clubes que estão nos lugares de topo da classificação.
Na temporada de 2018/19, a primeira depois do reinado de Wenger, o Arsenal terminou a um ponto do top-4 e chegou à final da Liga Europa. No verão seguinte, o clube gastou mais de 140 milhões de libras em transferências de jogadores. Fomos buscar Kieran Tierney, Gabriel Martinelli, David Luíz, Nicolas Pépé e Dani Ceballos (este por empréstimo). Vamos tirar William Saliba desta conversa porque o francês nem sequer chegou a treinar com a equipa e foi imediatamente emprestado de volta ao Saint-Étienne.
As expectativas dos adeptos do Arsenal – e tão bem me lembro de se falar nisso nos podcasts – passavam por um top-4 tranquilo. Em vez disso, a equipa regrediu – mas porquê?
Um dos principais motivos para isso foi a saída de diversos jogadores que estavam já adaptados à liga inglesa – Aaron Ramsey, Nacho Monreal, Laurent Koscielny, Danny Welbeck, Alex Iwobi e Henrikh Mkhitaryan. Para além desses, Mesut Özil fazia ainda parte do plantel mas começava a cair nas escolhas do treinador.
Com a exceção de David Luíz, todos os outros jogadores tinham 24 ou menos anos de idade e chegavam a um novo país tendo que se adaptar a uma nova liga e a expectativas mais altas do que aquelas que estavam habituados.
– Ceballos desapareceu depois da excelente exibição contra o Burnley, até regressar em boa forma na segunda metade da temporada.
– Pépé demorou quatro meses a marcar o seu primeiro golo sem ser de bola parada.
– Martinelli, causou mais impacto do que aquele que se esperava, mas tinha apenas 18 anos de idade e vinha da quarta divisão brasileira, tendo muito para aprender ainda.
– Tierney passou por vários problemas físicos e só começou atuar ao melhor nível depois do lockdown causado pelo Covid-19.
O que os responsáveis e adeptos do clube esperavam é que estas contratações – talvez com a exceção de Gabriel Martinelli – chegassem e causassem impacto imediato. Isso não aconteceu e o clube começou andar para trás.
Não sou fã de Willian mas não critiquei a sua contratação, dizendo que se os primeiros dois anos fossem bons, não me preocupava com as suas exibições no último ano de contrato. A sua contratação foi principalmente derivada de jogadas entre empresário e responsáveis do clube, mas a sua chegada ao Emirates trouxe experiência ao plantel e um jogador bastante conhecedor da liga que estava já completamente adaptado, algo que era uma lacuna na equipa de Mikel Arteta.
Os responsáveis do Arsenal parece que definiram então dois critérios a cumprir na maioria das contratações para esta janela de transferências:
1- Devem estar dentro de uma faixa etária jovem por dois motivos: terem a motivação de continuar a crescer e terem valor de venda no futuro;
2- Têm de ser capazes de chegar e causar impacto imediato;
A resposta a estes critérios não é difícil de se alcançar: os jogadores terão de ter menos de 25 anos e estarem adaptados à Premier League. Obviamente terão de ser jogadores de qualidade, o que significa que serão mais caros. Haja dinheiro para os ir buscar.
Agora, é preciso estar ciente que contratar na Premier League não dá automaticamente garantias de sucesso. Apenas aumenta as hipóteses de tal acontecer. Vamos olhar, por exemplo, para Yves Bissouma. Ninguém nega que é um jogador de qualidade, mas as expectativas de um clube como o Brighton são completamente diferentes do Arsenal. O Arsenal até pode ir buscar o jogador ao sul de Inglaterra, mas a partir desse momento toda a gente irá comentar e analisar cada passe que ele faz – existe um nível de pressão adicional àquele que o jogador está habituado no Amex Stadium.
Mas em termos de adaptação ao ritmo e à dureza do campeonato, Bissouma adaptou-se bastante bem. Portanto, é menos um obstáculo no caminho. Um jogador que chegue de uma liga estrangeira terá de se adaptar e ainda lidar com todas as expectativas e pressões que existem em torno dos seus desempenhos no Arsenal.
O Chelsea contratou Kai Havertz no ano passado – um dos principais talentos do futebol europeu. Nunca pareceu confortável em Stamford Bridge nos seus primeiros seis meses no clube. Agora, demonstra que poderá ser um dos melhores jogadores da Premier League nos próximos tempos.
Poderemos também olhar para alguns dos que foram nossos jogadores – Thierry Henry, Dennis Bergkamp, Laurent Koscielny, Nacho Monreal, entre outros. Não quero dizer que todos eles estiveram ao mesmo nível ou tiveram a mesma influência no clube, mas a verdade é que eles têm algo em comum: tiveram dificuldades nos primeiros tempos em Inglaterra até se acabarem por adaptar à liga.
O que isto quer dizer é que vale mesmo a pena contratar jogadores no estrangeiro, desde que estejamos certos das suas qualidades. Mas começa a ser imperativo ter algum equilíbrio no plantel – algo que nos tem faltado. É fácil acrescentar jogadores de outras ligas quando o plantel é estável. Mas este Arsenal tem tudo menos um plantel estável.
Dito isto, se vamos realmente fazer sete contratações nesta janela de transferências como é a vontade de Mikel Arteta, não têm todas (e está visto que não) de serem feitas na Premier League. Contratando 3 ou 4 jogadores na liga o resto poderá vir do estrangeiro sem qualquer problema.
Quem segue o futebol belga diz que Sambi Lokonga é um talento e uma excelente aposta. Então que venha! O que teremos de evitar é trazer o Lokonga e contar com ele para fazer mais de 30 jogos na Premier League na sua temporada de estreia.
É importante estarmos cientes daquilo que cada transferência pode trazer e por isso teremos de gerir as nossas expectativas de acordo com cada nome que for anunciado. Ter um núcleo de jogadores que conhece bem a liga é importante para ajudar os reforços que chegam do estrangeiro na sua integração.
Vamos olhar para Fabinho – um jogador que passou pelo futebol português e foi contratado pelo Liverpool por 40 milhões de libras. Nos seus primeiro meses em Anfield teve muitas dificuldades em se adaptar ao ritmo da Premier League. Mas o Liverpool é um clube com um plantel estável – com jogadores como Jordan Henderson que são grandes conhecedores da liga inglesa e pôde preencher a espaços as falhas de Fabinho no tempo em que este se adaptava à liga e ao país, algo que acabou por acontecer.
Esse foi um luxo que Nicolas Pépé não teve – e a expectativa era que este causasse impacto imediato, muito por culpa do valor pelo qual foi contratado, e isso acabou por não acontecer sendo depois o novo bode expiatório da imprensa e de alguma massa adepta.
Nos últimos 5 anos, Manchester City e Liverpool foram as equipas com mais sucesso na Premier League. Esse é o standard que teremos de ambicionar. Não temos de copiar exatamente tudo aquilo que eles fizeram, mas é importante analisar de que forma alcançaram o sucesso. Um fator comum entre os dois clubes foi o núcleo de jogadores que foram buscar na Premier League.
O Liverpool contratou Georginio Wijnaldum, Sadio Mané, Virgil van Dijk e Andy Robertson – tudo na Premier League. E sim, também foram buscar nomes fora de Inglaterra como Allison, Fabinho e Salah, entre outros. Mas o grupo de jogadores que contratou com experiência de Premier League foi fundamental para o equilíbrio do plantel. Tudo se encaixou perfeitamente no puzzle montado por Jurgen Klopp.
O Arsenal tem feito a maioria dos seus negócios fora de Inglaterra desde a temporada 2015/16. Nem todos se adaptaram ao país e à liga, e a situação piora quando mais jogadores na mesma situação vão sendo adicionados ao plantel.
Por isso, para concluir, pode ser uma estratégia bem pensada pelos responsáveis do clube em olhar para dentro da Premier League no que toca a reforços – mesmo pagando mais – pois sabemos à partida o que estamos a comprar. E se a estes reforços conseguirmos contratar de forma inteligente fora de portas – Sambi Lokonga, Manuel Locatteli, James Maddison, entre outros, poderemos vir a ter o equilíbrio perfeito no plantel que nos volte a colocar entre os melhores.
Vamos ver o que vai acontecer, mas os nomes a que somos associados nesta janela dão sinais encorajadores.
Ricardo Pires